Eternal sunshine of the spotless mind

Eu estou aqui porque quero esquecê-lo, Doutor. É ele que eu quero apagar da minha memória. Assim que descobri sobre seu trabalho decidi que quero esquecer de tudo. Todos os detalhes. Aqui estão os objetos que você pediu. Cada mínima coisa que eu encontrei em casa que me lembra, ou pode um dia me fazer lembrar dele. É pra eu dizer algo sobre eles, certo? Oh… Isso pode levar algum tempo. Tudo bem, vamos lá. 

Esse é o recibo do salão do dia 19 de julho de 2012. O dia em que tudo começou. Pintei minhas unhas de amarelo naquela tarde e ele cortou o cabelo. Esses são todos os desenhos que fiz dele desde aquele dia. Sim, são muitos. Eles são bem parecidos. Note que ele usa a mesma roupa em todos… Era a unica imagem que eu tinha dele. Eles não são muito bons. Esses são os alargadores e a palheta que comprei pra ele em seu aniversário e nunca tive coragem de entregar. Ele não usa palhetas mesmo. 

Nesse CD estão as nossas músicas. Todas elas. Apaguei-as do computador, não quero mais ouvi-las e, se pretendo apagá-lo, nem posso. Apesar de que If It Means A Lot To You e todas as do Kings Of Leon vão me fazer falta antes de dormir. Esse é o convite da festa em que nos vimos, e os lenços que usei para limpar minhas lágrimas naquela noite. Também não sei o motivo de os ter guardado. Esse é o pacote das balas que comi antes de vê-lo na semana seguinte, e essa é a blusa que usei. Ainda tem o cheiro dele. Bom, esse vai doer. É o meu computador. Tem muitas fotos e textos pra ele ai. Ia dar muito trabalho apagar tudo, eu não ia conseguir. Fique com ele. Sobre as memórias na minha mente? Ah… Essas são infinitas. 

Queria te pedir para apagar exatamente tudo. Não quero me lembrar das brigas, muito menos de como ele me tratava de qualquer jeito. Isso danificou muito o meu fígado, pergunte ao dono do bar da esquina de casa. Ele conhece muito bem essa história. Quero esquecer todas as vezes que ele me esqueceu e trocou por outras. Quero esquecer da maneira que ele brigava comigo e me fazia pensar do jeito que ele pensava. Mas ah, eu até que gostava disso, sabe? Gostava quando ele ficava com ciúme e parava de falar comigo. Gosto ainda, pra ser sincera. Gostava quando ele me chamava de “lindoca”, “pretinha” ou até mesmo “vic”. Talvez eu não queira me esquecer disso.  

Posso ficar com a lembrança das vezes que ele se preocupou comigo e disse que me achava bonita? Não? Ah. Tudo bem. E com a lembrança de quando a gente quase desenrolou, posso guardar essa? Por favor? Não também? E das inúmeras vezes que ele me fez rir e eu fui dormir com um sorriso nos lábios? Ah Doutor, eu não quero me esquecer disso. Tudo bem, vai ser melhor não me lembrar disso. Ah! Não! Por favor, me diz que pelo menos o sorriso e o cheiro dele vão poder ficar comigo. Eu não posso me esquecer do sorriso dele, Doutor. Não vou me lembrar? Não, Doutor. Não faz isso comigo. Talvez seja melhor eu ir embora. Vamos esquecer essa ideia. Me desculpe Doutor, mas é que sem o sorriso dele não dá. 

- Em Tenebris