5.3.13

Heavy of heart, weary of soul


Sozinha. Assim que acabou. As luzes do teatro se apagaram e a platéia esvaziou-se. A música parou. Os aplausos, também. Sentada na coxia, a atriz chorava aos soluços, limpando as lágrimas confusas, nas pétalas das rosas que lhe foram atiradas no final da peça. Havia sido ovacionada, aplaudida de pé. A cidade nunca havia recebido uma história tão bem produzida como essa. Ela fazia Aurélia, de Senhora, a mulher perfeita e ideal, disputada: a mais bonita de todas. Era assim que ela se sentia no palco. 

Ficava envergonhada com os olhares maliciosos dos rapazes que sentavam nas ultimas fileiras do teatro e se emocionava com os olhinhos brilhantes das menininhas que iam assistir a peça com suas mães e a esperavam no final do espetáculo para lhe darem beijos e pedirem autógrafos. Queriam ser como ela, mas não sabiam, nem entendiam, que ela apenas interpretava Aurélia e, que também, queria ser como ela. 

Soluçava aos prantos enquanto despia-se do figurino. Tirava a maquiagem como quem tira uma máscara. Ao sair do camarim sentia-se pesada, como se para entrar no palco ela deixasse toda a sua carcaça, e adentrava na peça vestindo apenas a alma. Ao se olhar no espelho via tudo aquilo que Aurélia a ajudava a esconder: insegurança, tristeza, medo, repreensão. Ela queria ser Aurélia do mesmo modo que uma garotinha quer ser bailarina, e um garotinho, jogador de futebol. Insatisfeita, guardava as inúmeras rosas que ganhava, numa caixa grande e branca, para que elas ali morressem. Sabia que os fãs amavam Aurélia e não ela. 

As rosas vermelhas aos poucos enxiam a caixa que ela carregava por todo o país, em todas as peças. Não deixava que ninguém soubesse o que escondia ali dentro; alguns falavam que era onde ela guardava o figurino, outros especulavam que eram os restos mortais de algum amor platônico... Ela sempre se negara a contar. Preferia o silêncio sempre. Irônico, não? Uma atriz que não gostava de falar, mas pra ela era melhor assim. Não sabia ser ela. Sabia ser outras. Aurélia, Julieta, Bela, Rosalina... O personagem que caísse em suas mãos, qualquer um que fosse. O importante era esconder o que ela tanto odiava: ela mesma. 

O diretor a chamava com ardor do lado de fora do camarim, pedia para que ela fosse atender os fãs que a esperavam do lado de fora do teatro. Vestiu-se novamente com outra carcaça que usava em horas como essa, a de atriz linda, forte, imponente. Saiu em direção aos que a esperavam, deixando no camarim a unica carcaça que ela se recusava a vestir, a dela.

- Em Tenebris. 

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