28.4.13

A bailarina e o chefe de quadrilha



Essa não é uma história muito fácil de narrar, caro leitor. Devo lhe avisar de antemão que o começo, meio e fim são compostos de trechos tristes e sádicos, sem muitos, ou talvez nenhum, momento feliz.

Era tarde da noite de um sábado cansado. A bailarina havia passado horas rodopiando pelo palco, sendo encharcada de aplausos e reverenciada com buquês de flores. Só naquela apresentação havia recebido três cartas anônimas de fãs apaixonados que lhe prometiam o céu, o mar e as estrelas para que ela dançasse só para eles pelo resto da vida. Ela tinha uma caixa especial para guardar esses mimos, lia sempre que seu verdadeiro amor não estava presente. As cartas faziam com que ela se sentisse amada, quando quem ela amava não podia fazer com que ela se sentisse assim.

Deixou o palco cansada, porém sorridente. Estava ansiosa pois seu amado havia lhe prometido que naquela noite ele estaria presente. Jurou de dedinho, fez todas as “pinky promises” que ela havia lhe pedido semanas antes. Ele estaria lá. Ele prometeu que sim. Trocou-se na maior velocidade possível, tentou ignorar os conhecidos e professores que seguiam parabenizando-lhe pelos corredores do imenso teatro e chegou a porta de entrada com o coração aflito em uma mão e as sapatilhas surradas em outra. Percorreu os olhos pelo salão, nada.

Mal sabia ela onde seu amor estava. Uma semana atrás havia recebido um ultimo aviso de uma quadrilha da cidade vizinha; ele teria uma semana para pagar suas dividas. Todos os seus homens já tinham sofrido as consequencias antes, se não pagasse, seria a sua vez de sofrer. Ele andava armado sempre, com dois ou três guarda-costas, carro blindado, roupas de marca, uma educação impecável, cara de mau - personalidade também - e um charme enlouquecedor. Um charme que nem uma famosa bailarina seria capaz de evitar.

Horas antes do espetáculo havia ido até o morro quitar suas dívidas. Sabia que não tinha o suficiente e que não ia conseguir acalmar a quadrilha por muito tempo... Ele era famoso por ser intolerável com pagamentos de dividas e no fundo sabia que esse seria o motivo do outro chefe também não ser. Há muito tempo não recebia trabalhos ou ganhava um bom dinheiro, o pouco que tinha gastava com presentes para sua bailarina. Seus homens? Eles apanhavam se reclamassem pelo atraso do salário. O amor da bailarina era um homem muito, muito mal, mas que com ela era muito, mas muito bom.

Haviam se amado por muito tempo. Ela sabia quem ele era. Tinha medo, muito medo, mas não se privava desse amor. Eram amigos de colégio antes de tudo isso. Se apaixonaram em silêncio e nunca se declararam, até que anos depois da formatura, se encontraram em uma festa na casa dele. Desde então, apresentações internacionais e fugas da polícia não foram o suficiente para separá-los.

A bailarina estralava os dedos na procura de seu amado. Não sabia da divida, não sabia do paradeiro dele. Respirava e inspirava fundo repetidas vezes, estava impaciente e decepcionada... Só precisava do sorriso dele para se recompor. Ele ainda estava no morro, há horas tentava se explicar para poder sair dali e ir de encontro a ela. O chefe da quadrilha oposta não aceitava suas desculpas, apontava o cano de uma 38 direto em seu pescoço e ele suava frio. Estava sozinho ali. Sem seus homens, sem sua bailarina. Não tinha mais para onde correr. Entregou-se. Os cachorros da vizinhança uivavam e latiam assustados com o barulho dos três tiros seguidos que o amor da bailarina havia levado. Logo depois, um negro e perfurador silêncio se estendia pelo local.

A bailarina ainda esperava. Andava em circulos e já não segurava mais as lágrimas. Olhava insistente para a rua e em seguida para o relógio que já marcava as três da manhã e sussurrava baixinho: ele não vem.

- Em Tenebris

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